
Violência e História: A Força da Dramaturgia em A Banda Épica na Noite das Gerais
Violência e História: A Força da Dramaturgia em A Banda Épica na Noite das Gerais
A Companhia do Latão mais uma vez nos presenteia com um espetáculo que alia pesquisa histórica, teatralidade e uma profunda análise política da realidade brasileira. Com A Banda Épica na NOITE DAS GERAIS, a companhia revisita a Ditadura Militar, construindo uma narrativa fragmentada, cheia de camadas, onde os personagens e a história recente do Brasil são os verdadeiros protagonistas.
O elenco numeroso equilibra atores experientes e jovens, trazendo vitalidade à cena e reforçando a ideia de que a história se desenrola de maneira coletiva. O início da peça sugere uma trama de mistério: acompanhamos uma banda universitária, um grupo privilegiado na realidade dos anos 70, viajando pelo interior de Minas Gerais. Mas, conforme a dramaturgia se desvela, emerge a história do Reformatório Krenak e mais um triste episódio da ditadura, narrado por vozes que falam com medo, como se fossem testemunhas tentando romper o silenciamento imposto.
A peça expõe um dos episódios mais brutais da repressão contra os povos indígenas: em 1972, eles foram arrancados de suas terras e transportados em vagões de gado, um dia depois do evento principal da história narrada na cena. Esse deslocamento forçado foi parte de uma política de perseguição que visava apagar identidades e desestruturar comunidades inteiras. Essa realidade emerge na dramaturgia não de forma expositiva, mas através de fragmentos, como se os personagens fossem pouco a pouco descobrindo o horror oculto sob a aparente normalidade.
A direção de Sérgio de Carvalho estrutura a narrativa de forma a despertar a curiosidade do público. Aos poucos, as violências que para os personagens são cotidianas revelam sua brutalidade incontestável. A retirada dos povos indígenas e a repressão política se tornam presenças fantasmagóricas que assombram a cena.
Outro grande acerto da montagem é a trilha sonora original, composta para a peça. As canções são executadas ao vivo e ajudam a construir a atmosfera dos anos 70 com uma precisão impressionante. A música aqui não é apenas um elemento de ambientação, mas um meio de comunicação dos sentimentos e das reflexões que atravessam a obra.
A dramaturgia evita fórmulas clichês e cria personagens densos. Um exemplo disso é a personagem de Helena Albergaria, que ao descobrir que sua filha sofreu violência física, tem sua reação frustrada pela realidade objetiva, deixando evidente a impossibilidade de resistência em um sistema brutalmente opressor.
Outro destaque é a atuação de Ney Piacentini como um fazendeiro conservador que se assemelha assustadoramente às figuras da extrema direita contemporânea. São 53 anos de distância entre a história retratada e o presente, mas as estruturas de poder se mantêm inalteradas. Esperemos que um dia essa imagem fossilizada desapareça na poeira do tempo.
A encenação estrutura a narrativa em flashes, pequenas cenas que se sobrepõem e constroem um painel complexo do período. Nada está mastigado; tudo deve ser descoberto pelo espectador, que se torna parte ativa da investigação proposta pela obra.
Este espetáculo dialoga diretamente com a pesquisa contínua da Companhia do Latão sobre a estrutura social e histórica do Brasil. Em dezembro, a companhia nos apresentou uma potente crítica ao patriarcado estrutural, utilizando textos de Truman Capote para explorar a condição feminina em diferentes contextos sociais. Se naquele trabalho o foco estava na opressão patriarcal como força invisível e estruturante, aqui a violência institucional se torna a grande protagonista. Essa continuidade na investigação dramatúrgica da companhia reafirma seu compromisso com um teatro que não apenas narra, mas desmonta as engrenagens do poder.
A Banda Épica na NOITE DAS GERAIS é um trabalho maduro, provocador e extremamente necessário, que reafirma a Companhia do Latão como uma das mais importantes do teatro político brasileiro. O espetáculo nos lembra que a memória é um campo de disputa e que a arte tem o poder de iluminar as sombras da história. A Companhia do Latão continua pulsante, forte e nos presenteando.
Serviço
A Banda Épica na NOITE DAS GERAIS – Companhia do Latão
📅 Temporada: 14 de fevereiro a 16 de março de 2025
🕗 Horários: Quinta a sábado, às 20h; domingos, às 18h (Exceto 02/03/2025)
🎭 Duração: 130 minutos | Classificação: 14 anos
💰 Ingressos: R$ 70 (inteira) / R$ 35 (meia) / R$ 21 (credencial Sesc)
🎟️ Vendas: centralrelacionamento.sescsp.org.br
📍 Local: Teatro Raul Cortez – Sesc 14 Bis
📍 Endereço: Rua Dr. Plínio Barreto, 285 – Bela Vista
📧 Contato: imprensa.14bis@sescsp.org.br
📞 Telefone: (11) 3016-7700
Ficha Técnica
✍ Criação coletiva: Companhia do Latão
📜 Argumento original: Sérgio de Carvalho
🎭 Atuação e música: Be Cruz, Beatriz Bittencourt, Caio Horowicz, Carlos Albergaria, Carlos Escher, Felipe Botelho, Gabriel Stippe, Helena Albergaria, Leonardo Ventura, Ney Piacentini, Nina Hotimsky, Rubens Alexandre, Sara Mello Neiva, Susanna Oliveira
🎬 Direção: Sérgio de Carvalho
🎼 Direção musical e composições originais: Felipe Botelho e Nina Hotimsky
🎭 Colaboração em dramaturgia e preparação de elenco: Helena Albergaria
🎭 Assistência de direção e produção: Maria Lívia Góes
🎭 Assistência de direção e dramaturgia: Ana Hirszman
🎭 Equipe cenográfica: Cássio Brasil, Anick Matalon, Carlos Oliveira (Nande), Rodolfo da Silva França
👗 Figurinos: Daniela Carvalho
🪡 Assistente de figurino: Rosa Albergaria
🎭 Adereços: Nenê Pais
💡 Iluminação: Melissa Guimarães
🔊 Desenho de som: Camila Fonseca
🎛️ Técnico de som: Lucas de Sá
🖌️ Arte para o programa: Marcius Galan
🖼️ Arte da divulgação: Pedro Andrada
📸 Fotos do programa: Miriam Silva
📖 Textos do programa: Maria Lívia Góes e Sérgio de Carvalho
📢 Assessoria de imprensa: Rafael Ferro e Pedro Madeira
🎭 Coordenação de produção: Mosaico Produções
🎭 Produção executiva: Cícero Andrade
🎭 Produtoras assistentes: Dani Simonassi e Érika Rocha
🎭 Realização: Companhia do Latão
