O espetáculo “Boris” está pronto
Assistir ao espetáculo “Bóris não está pronto” foi uma
experiencia duplamente recompensadora, tanto pelo espetáculo por si, quanto por
ver o desenvolvimento do trabalho do Coletivo Dolores Boca Aberta que conheço há
muitos anos, mas que eu já há algum tempo não acompanhava (erro
meu). Trata-se de um belíssimo espetáculo que discute a masculinidade de forma singular.
De partida o trabalho se inicia com um tema musical que para mim é um achado, uma canção que é muito popular entre os adolescentes há
mais de 30 anos pelas escolas da periferia paulistana, mas que colocada no contexto
que o espetáculo nos propõe, passa a simbolizar o método na
formação do jovem dentro da cultura machista, é curioso rever e passar a “estranhar” uma música tão conhecida.
As maneiras como homens e mulheres se comportam correspondem
aos aprendizados socioculturais que nos ensinam a agir de acordo com
prescrições de cada gênero. Além da determinação de dimensão biológica e
associada à natureza (sexo) da dimensão social e associada à cultura (gênero). As representações de gênero são distintas de
uma cultura para outra, tanto que existe uma grande diversidade de expressões
em diferentes grupos e locais, cabe observar como isto ocorre para que possamos
identificar e desnaturalizar os padrões. O espetáculo cumpre este papel,
demonstrando e assim desnaturalizando o “homem periférico paulistano”, como este
tipo social específico tem sua identidade de gênero forjada, e como esta
construção influi nas suas relações sociais.
A direção foi precisa, dramaturgia clara, é interessante ver
como alguns elementos que eram apontados em outros espetáculos do Coletivo agora são
apresentados de forma madura, a linguagem do Dolores possui uma linguagem própria, nos mais de vinte anos de convivio entre os seus componentes. Os quatro atores estão seguros, todos têm clareza de que tipo de debate trazem a cena. Elenco e direção com grande afinamento, todos com um proposito único.
Para mim particularmente foi importante assistir ao espetáculo. Fui criado na periferia
(não longe daí) e há muitos anos penso em que tipo de pessoa eu seria se não tivesse sido criado inserido na cultura falocrata. Eu me lembro que na adolescência tinha de observar cada fala e cada gesto público, para que correspondesse ao esperado para alguém do meu genero e idade, o menino na periferia ao crescer devia, naquele periodo, provar a sua masculinidade cotidianamente. O Dolores põe esta discussão em pauta com maestria, em um espetáculo sensível, politicamente consciente e nada panfletário.
Um grande espetáculo.
CDC Vento Leste
R. Dr. Frederico Brotero, 60
Cidade Patriarca, São Paulo – SP, 03552-080
ÚLTIMOS DIAS
Sábado (24/06) 20:00hs
Domingo (24/06) 19:00hs
FICHA TÉCNICA
Luciano Carvalho
Tiago Mine
Cristiano Carvalho
João Alves
Fernando Couto
João Alves
Tiago Mine e Luciano Carvalho